Evangélicos com alma Católica.
Os evangélicos no Brasil nunca conseguiram se livrar totalmente da influência do Catolicismo Romano. Por séculos, o Catolicismo formou a mentalidade brasileira, a sua maneira de ver o mundo ("cosmovisão"). O crescimento do número de evangélicos no Brasil é cada vez maior – segundo o IBGE (2008), somos 40 milhões – mas há várias evidências de que boa parte dos evangélicos não tem conseguido se livrar da herança católica.
É um fato que a conversão verdadeira (arrependimento e fé) implica uma mudança espiritual e moral, mas não significa necessariamente uma mudança na maneira como a pessoa vê o mundo. Alguém pode ter sido regenerado pelo Espírito e ainda continuar, por um tempo, a enxergar as coisas com os pressupostos antigos. É o caso dos crentes de Corinto, por exemplo. Alguns deles haviam sido impuros, idólatras,adúlteros, efeminados, sodomitas, ladrões, avarentos, bêbados,maldizentes e roubadores. Todavia, haviam sido lavados, santificados e justificados “em o nome do Senhor Jesus Cristo e no Espírito do nosso Deus” (1 Co 6.9-11), sem que isso significasse que uma mudança completa de mentalidade houvesse ocorrido com eles. Na primeira carta que lhes escreve, Paulo revela duas áreas em que eles continuavam a agir como pagãos: na maneira grega dicotômica de ver o mundo dividido em matéria e espírito (que dificultava a aceitação entre eles das relações sexuais no casamento e a ressurreição física dos mortos – capítulos 7 e 15) e o culto à personalidade mantido para com os filósofos gregos (que logo os levou a formar partidos na igreja em torno de Paulo, Pedro, Apolo e mesmo o próprio Cristo – capítulos
Da mesma forma, creio que grande parte dos evangélicos no Brasil tem a alma católica. Antes de passar às argumentações, preciso esclarecer um ponto. Todas as tendências que eu identifico entre os evangélicos como sendo herança católica, no fundo, antes de serem católicas, são realmente tendências da nossa natureza humana decaída, corrompida e manchada pelo pecado, que se manifestam em todos os lugares, em todos os sistemas e não somente no Catolicismo. Como disse o reformado R.Hooykas, famoso historiador da ciência, “no fundo, somos todos romanos” (Philosophia Liberta, 1957). Todavia, alguns sistemas são mais vulneráveis a essas tendências e as absorveram mais que outros,como penso que é o caso com o Catolicismo no Brasil. E que tendências são essas?
1) O gosto por bispos e apóstolos
Na Igreja Católica, o sistema papal impõe a autoridade de um único homem sobre todo o povo. A distinção entre clérigos (padres, bispos, cardeais e o papa) e leigos (o povo comum) coloca os sacerdotes católicos em um nível acima das pessoas normais, como se fossem revestidos de uma autoridade, um carisma, uma espiritualidade inacessível, que provoca a admiração e o espanto da gente comum,infundindo respeito e veneração. Há um gosto na alma brasileira por bispos, catedrais, pompas, rituais. Só assim consigo entender a aceitação generalizada por parte dos próprios evangélicos de bispos e apóstolos autonomeados, mesmo após Lutero ter rasgado a bula papal que o excomungava e queimá-la na fogueira. A doutrina reformada do sacerdócio universal dos crentes e a abolição da distinção entre clérigos e leigos ainda não permearam a cosmovisão dos evangélicos no Brasil, com poucas exceções.
2) A idéia de que pastores são mediadores entre Deus e os homens
No Catolicismo, a Igreja é mediadora entre Deus e os homens e transmite a graça divina mediante os sacramentos, as indulgências, as orações. Os sacerdotes católicos são vistos como aqueles através de quem essa graça é concedida, pois são eles que, com as suas palavras, transformam, na Missa, o pão e o vinho no corpo e no sangue de Cristo;que aplicam a água benta no batismo para remissão de pecados; que ouvem a confissão do povo e pronunciam o perdão de pecados. Essa mentalidade de mediação humana passou para os evangélicos, com poucas mudanças. Até nas igrejas chamadas históricas, os crentes brasileiros agem como se a oração do pastor fosse mais poderosa do que a deles e como se os pastores funcionassem como mediadores entre eles e os favores divinos.
Esse ranço do Catolicismo vem sendo cada vez mais explorado por setores neopentecostais do evangelicalismo, a julgar por práticas já assimiladas como “a oração dos 318 homens de Deus”, “a prece poderosa do bispo tal”, “a oração da irmã fulana, que é profetisa”, etc.
3) O misticismo supersticioso no apego a objetos sagrados
O Catolicismo no Brasil, por sua vez influenciado pelas religiões afro-brasileiras, semeou misticismo e superstição durante séculos na alma brasileira: milagres de santos, uso de relíquias, aparições de Cristo e de Maria, objetos ungidos e santificados, água benta, entre outros. Hoje, há um crescimento espantoso, entre setores evangélicos,do uso de copo d’água, rosa ungida, sal grosso, pulseiras abençoadas,pentes santos do kit de beleza da rainha Ester, peças de roupa de entes queridos, oração no monte, no vale; óleos de oliveiras de Jerusalém, água do Jordão, sal do Vale do Sal, trombetas de Gideão (distribuídas em profusão), o cajado de Moisés… é infindável e sem limites a imaginação dos líderes e a credulidade do povo. Esse fenômeno só pode ser explicado, ao meu ver, por um gosto intrínseco pelo misticismo impresso na alma católica dos evangélicos.
4) A separação entre sagrado e profano
No centro do pensamento católico existe a distinção entre natureza e graça, idealizada e defendida por Tomás de Aquino, um dos mais importantes teólogos da Igreja Católica. Na prática, isso significou a aceitação de duas realidades coexistentes, antagônicas e freqüentemente irreconciliáveis: o sagrado, substanciado na Santa Igreja, e o profano, que é tudo o mais no mundo lá fora. Os brasileiros aprenderam durante séculos a não misturar as coisas: sagrado é aquilo que a gente vai fazer na Igreja: assistir Missa e se confessar. O profano – meu trabalho, meus estudos, as ciências – permanece intocado pelos pressupostos cristãos, separado de forma estanque. É a mesma atitude dos evangélicos. Falta-nos uma mentalidade que integre a fé às demais áreas da vida, conforme a visão bíblica de que tudo é sagrado. Por exemplo, na área da educação, temos por séculos deixado que a mentalidade humanista secularizada, permeada de pressupostos anticristãos, eduque os nossos filhos, do ensino fundamental até o superior, com algumas exceções. Em outros países, os evangélicos têm tido mais sucesso em manter instituições de ensino que, além de serem tão competentes como as outras, oferecem uma visão de mundo, de ciência, de tecnologia e da história oriunda de pressupostos cristãos. Numa cultura permeada pela idéia de que o sagrado e o profano, a religião e o mundo, são dois reinos distintos e freqüentemente antagônicos, não há como uma visão integral surgir e prevalecer, a não ser por uma profunda reforma de mentalidade entre os evangélicos.
5) Somente pecados sexuais são realmente graves
A distinção entre pecados mortais e veniais feita pelo catolicismo romano vem permeando a ética brasileira há séculos. Segundo essa distinção, pecados considerados mortais privam a alma da graça salvadora e a condenam ao inferno, enquanto que os veniais, como o nome já indica, são mais leves e merecem somente castigos temporais.A nossa cultura se encarregou de preencher as listas dos mortais e dos veniais. Dessa forma, enquanto se pode aceitar a “mentirinha”, o jeitinho, o tirar vantagem, a maledicência, etc., o adultério se tornou imperdoável. Lula foi reeleito cercado de acusações de corrupção. Mas, se tivesse ocorrido uma denúncia de escândalo sexual,tenho dúvidas de que teria sido reeleito ou de que teria sido reeleito por uma margem tão grande. Nas igrejas evangélicas – onde se sabe pela Bíblia que todo pecado é odioso e que quem guarda toda a lei de Deus e quebra um só mandamento é culpado de todos – é raro que alguém seja disciplinado, corrigido, admoestado, destituído ou despojado por pecados como mentira, preguiça, orgulho, vaidade, maledicência, entre outros. As disciplinas eclesiásticas acontecem via de regra por pecados de natureza sexual, como adultério, prostituição, fornicação,adição à pornografia, homossexualismo, etc., embora até mesmo esses estão sendo cada vez mais aceitáveis aos olhos evangélicos. Mais um resquício de catolicismo na alma dos evangélicos?
O que é mais surpreendente é que os evangélicos no Brasil estão entre os mais anticatólicos do mundo. Só para ilustrar (e sem entrar no mérito dessa polêmica), o Brasil é um dos países onde convertidos do catolicismo são rebatizados nas igrejas evangélicas. O anticatolicismo brasileiro, todavia, se concentrou apenas na questão das imagens e de Maria e em questões éticas como não fumar, não beber e não dançar. Não foi e não é profundo o suficiente para fazer uma crítica mais completa de outros pontos que, por anos, vêm moldando a mentalidade do brasileiro, como mencionei acima. Além de uma conversão dos ídolos e de Maria a Cristo, os brasileiros evangélicos precisam de conversão na mentalidade, na maneira de ver o mundo.
Temos de trazer cativo a Cristo todo pensamento, e não somente os nossos pecados. Nossa cosmovisão precisa também de conversão (2 Co 10.4-5). Quando vejo o retorno de grandes massas ditas evangélicas às práticas medievais católicas de usar no culto a Deus objetos ungidos e consagrados, procurando para si bispos e apóstolos, imersas em práticas supersticiosas, me pergunto se, ao final das contas, o neopentecostalismo brasileiro não é, na verdade, um filho da Igreja Católica medieval, uma forma de neocatolicismo tardio que surge e cresce em nosso país, onde até os evangélicos têm alma católica.
Pitaco da Meire
- É uma herança maldita essa de sempre procurar alguém pra colocar no lugar do sumo sacerdote, dia após dia estamos recosturando o Véu do Templo que foi rasgado há mais de dois mil anos, através do sacrifício de Jesus na Cruz.
- Outro dia vi um "bispo" da Igreja Mundial do Poder de Deus falar na televisão que ele iria pagar o preço pelas vidas que o procuravam em busca de ajuda, como a cura física que é sem dúvida o carro chefe dessa igreja;
- E por adotarem pessoas como mediadoras entre elas e Deus, essas usam do artifício de consagrar no monte toda espécie de objeto, para que em algum momento de carência o fiel recorra ao amuleto, e assim a igreja fideliza o fiel contribuinte;
- A separação entre o sagrado e o profano no meio evangélico veio em forma de: pode/não pode, e por séculos ninguém questionava onde essas regras foram feitas. Era como se cada líder tivesse tido a experiência de Moises no Monte Sinai quando recebeu os Dez Mandamentos, logo, o que ele falava ser pecado era uma revelação divina;
Que Deus tenha misericórdia da sua igreja que procura a todo instante atalhos para si, então não precisar agir como verdadeiros cristãos, pessoas com o chamado divino de refletir Cristo através de cada movimento, cada palavra, na forma de ouvir e de falar. Que essa seja nossa oração de cada dia: Lamentações 5:21
"Mas a hora vem, e agora é, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque o Pai procura a tais que assim o adorem." - João 4:23
Meire,
Particularmente, me identifico muito com seus posts....acho que eles agregam verdadeiros valores Cristãos.
Por outro lado, é de entristecer ver o quanto as pessoas tem sido enganadas e não conseguem se livrar de conceitos e pré-conceitos distorcidos durante séculos.
Confesso que as vezes me incomoda ser chamado de "evangélico", considerando que esse "título" tem deixado de representar verdadeiramente o que deveria. Não pelo título em si, é claro, mas pelo que pessoas que ainda não entenderam nada (nada mesmo) sobre a palavra de Deus fazem com ele, por meio de seus péssimos testemunhos e pregações.
Creio que a herança cultural-religiosa é uma das maiores dificuldades a serem vencidas. Soma-se a ela a falta de comprometimento bíblico (e caráter) que muitos líderes tem em relação à palavra de Deus.
Eu defendo a seguinte tese: Diga não a religião! (http://rcantini.blogspot.com/2009/05/diga-nao-religiao.html)
Que Deus nos abençoe!
www.cantini.com.br/blog
É Ricardo, dois mil anos se passaram e continuamos como os fariseus.
Pensamos muitas vezes que Jesus veio à esse mundo tenebroso, apenas para falar o que pode e o que não pode. Esquecemos que Ele veio pregar Vida, Doar Sua Vida e assim termos a Vida Eterna. Que podemos sim, antecipar o céu estando aqui na Terra.
O Evangelho é simples, mas assim como o povo de Israel acrescentou Lei sobre Lei, assim também estamos fazendo.
Que Deus tenha misericórdia de nós.
Como me senti ofendido com este post, deixo aqui no link abaixo alguns dos argumentos que tenho para ser católico (lembrando que nós católicos somos evangélicos. Por algumas questões históricas o protestante passou a ser chamado de evangélico), além de minha igreja possuir 2.000 anos e de ter uma doutrina perfeita e sólida (e que muitos infelizmente deturpam). Não é uma tradução bíblica ao meu bel prazer. Ora, é fácil e conveniente eu sair em busca da "religião" que mais me agrada, que me convém, que vai me trazer 'conforto financeiro e prosperidade'. Em Mateus 7:13 diz: "Entrai pela porta estreita, porque larga é a porta e espaçoso o caminho que conduzem à perdição e numerosos são os que por aí entram."
Eis aqui:
http://defesacatolica.blogcatolico.com.br/2009/03/28/cinco-perguntas-a-que-nenhum-protestante-consegue-responder/
Na verdade ao invés de escrever coisas desse tipo deveríamos sim unir forças contra a violência, a guerra, o ódio, o desamor e a destruição da natureza, obra do Criador... E não ficar disputando fiéis.
Pax!